23.8.09

A deliquência acadêmica

É evidente que as reflexões principais sobre os grandes temas não envelhecem. Triste é perceber que as mesmas questões que emperravam a vida acadêmica, no final dos anos 70 do século passado, ainda continuam tão atuais...

Prova disso é o texto de Maurício Tragtenberg que você pode ler na íntegra (clicando ali no nome do autor) ou o trecho que selecionei abaixo:


"O pensamento está fundamentalmente ligado à ação. Bergson sublinhava no início do século XX a necessidade do homem agir como homem de pensamento e pensar como homem de ação. A separação entre “fazer” e “pensar” se constitui numa das doenças que caracterizam a delinquência acadêmica – a análise e discussão dos problemas relevantes do país constitui um ato político, constitui uma forma de ação, inerente à responsabilidade social do intelectual. A valorização do que seja um homem culto está estritamente vinculada ao seu valor na defesa de valores essenciais de cidadania, ao seu exemplo revelado não pelo seu discurso, mas por sua existência, por sua ação.

Ao analisar a “crise de consciência” dos intelectuais norte-americanos que deram o aval da “escalada” no Vietnã, Horowitz notara que a disposição que eles revelaram no planejamento do genocídio estava vinculada à sua formação, à sua capacidade de discutir meios sem nunca questionar os fins, a transformar os problemas políticos em problemas técnicos, a desprezar a consulta política, preferindo as soluções de gabinete, consumando o que definiríamos como a traição dos intelectuais. É aqui onde a indignidade do intelectual substitui a dignidade da inteligência.

Nenhum preceito ético pode substituir a prática social, a prática pedagógica.

A delinquência acadêmica se caracteriza pela existência de estruturas de ensino onde os meios (técnicas) se tornam os fins, os fins formativos são esquecidos; a criação do conhecimento e sua reprodução cede lugar ao controle burocrático de sua produção como suprema virtude, onde “administrar” aparece como sinônimo de vigiar e punir – o professor é controlado mediante os critérios visíveis e invisíveis de nomeação; o aluno, mediante os critérios visíveis e invisíveis de exame. Isso resulta em escolas que se constituem em depósitos de alunos, como diria Lima Barreto em “Cemitério de Vivos”."



Trecho de texto apresentado no I Seminário de Educação Brasileira, realizado em 1978, em Campinas-SP. Publicado em: TRAGTENBERG, M. Sobre Educação, Política e Sindicalismo. São Paulo: Editores Associados; Cortez, 1990, 2ª ed. (Coleção teoria e práticas sociais, vol 1)


22.8.09

"CONSTELAÇÃO TABLADA"



Belíssimo trabalho de tradução do poeta Ronald Polito para a edição bilingue (EDUSP, 2008) de José Juan TABLADA. A maior parte da obra do grande poeta mexicano (1871-1945) está reunida nesse livro, que traz uma rica apresentação também feita por Ronald Polito. O livro ainda contém páginas de notas esclarecedoras, cronologia e bibliografia sobre a "constelação Tablada", como o tradutor chamou o vasto e diferenciado conjunto de "mundos e tempos, estações, floras, faunas, deuses, povos, histórias, mitos, formas e linguagens" do poeta do "cogumelo azul".

14.8.09

8.8.09

PROVOCAÇÕES nº 425

Pela primeira vez em seus 129 anos, a revista americana Science dedicou sua capa à pesquisa de um brasileiro, o neurocientista Miguel Ângelo Laporta Nicolelis. Paulistano de 48 anos, Nicolelis dirige, desde 1994, o Centro de Neurociência da Universidade Duke, na Carolina do Norte, nos Estados Unidos. Nicolelis é uma referência mundial na pesquisa da interface entre o cérebro e os computadores. Há anos ele trabalha com implante de próteses no cérebro de pacientes paralisados com lesões na medula – seu objetivo é permitir que voltem a andar, controlando trajes robóticos com o pensamento. Em seu novo estudo, ele ampliou a aplicação de sua pesquisa: Nicolelis deu uma nova direção às tentativas de curar o mal de Parkinson. “Com este artigo da Science, abri uma nova frente de trabalho”, diz.


O admirável programa de ANTONIO ABUJAMRA, o PROVOCAÇÕES, chega a sua 425 edição e o convidado é Miguel Nicolelis:


O neurocientista Miguel Nicolelis é formado pela USP, mas muito cedo deixou o país. "Sou da geração obliterada, que não teve a chance de agir pelo Brasil". No final dos anos 80, começo dos 90, para Miguel, a "ciência brasileira quase colapsou".
Agora, de volta ao país, Miguel quer demonstrar, na periferia de Natal, que a produção do conhecimento de ponta pode ser descentralizada no Brasil. "O talento científico existe onde houver um ser humano pensando".

E no que Miguel Nicolelis vem pensando em sua pesquisa pessoal? Ele quer entender "como os circuitos do cérebro produzem todos os comportamentos que fazem o ser humano ser o que é". Para ele, o cérebro não precisa mais do corpo para exercer seu desejo de interagir com o mundo. Isto é "a neurociência permitindo que o cérebro expresse essa condição humana sem limites espaciais e temporais".


Entre tantas provocções que o programa sempre suscita, uma das mais interessantes foi a declaração de Miguel Nicolelis ao afirmar que sua pesquisa se assemelha à poesia.

4.8.09

HOJE É ANIVERSÁRIO DO POETA
TAZIO ZAMBI

PARA CELEBRAR A DATA, ME APROPRIO DE UM DE SEUS POEMAS RECENTES, UMA SACADA FODEROSA, MONTAGEM FEITA DE REFLEXÃO, HUMOR E HABILIDADE GRÁFICA





O POETA É A SEREIA DO SALGADINHO



Para quem não conhece Maceió, vale o glossário: Salgadinho é o nosso Tietê, nosso Arrudas: nosso esgoto a céu aberto. Para você que traz de cor a definição de Ezra Pound "O poeta é a antena da raça", e o contra-ataque de Philadelpho Menezes, via Maiakóvski, "O poeta é a antena da praça", também sabe porque um poeta não se faz com versos: é preciso faro fino, muita arte&manha para marcar o gol de placa do TZ.
VIVA O TZ!!!



POETAS, FLORES & ENIGMAS

Dando continuidade às comemorações do aniversário de meu querido amigo Tazio Zambi, falemos de FLORES:




O poeta Eduardo Kac, um dos malucos mais geniais que tive o prazer de conhecer, de quem recebi, aliás, em primeira mão, a revista Escracho (depois falo dela) nos adoráveis anos 80, apresentou recentemente mais uma de suas sacadas brilhantes: EDUNIA, a flor que ele criou. Creiam-me, o cara modificou geneticamente uma flor (Petunia) a partir de seu próprio DNA!
Confiram no site dele. É só clicar aqui.

3.8.09

MORVERN CALLAR



Amanheci pensando em um filme que assiti na França, em 2002. A atriz protagonista é a maravilhosa Samantha Morton, que está ótima no papel de Morvern Callar.O filme foi realizado por Lynne Ramsay a partir da adaptação do livro homônimo, de Alan Warner.O resultado é muito bom, inclusive a música (Stereolab).

O roteiro é simples: as aventuras de uma moça comum, na Escócia, que encontra o namorado suicidado na sala de seu apartamento, na véspera do Natal. Ela entra em pânico ao ver o corpo do rapaz estendido no chão, numa poça de sangue. No computador, além de uma declaração de amor, Morvern tem a obra inédita do falecido e o pedido dele para ser publicado. E ela obedece. Depois de se livrar do corpo (ela faz picadinho do defunto e transporta tudo, aos poucos, para um local bem afastado) encaminha os originais do livro e é procurada por uma editora interessadíssima em publicá-la. Sim, porque o curioso é o fato de que ela assume a autoria do texto. A partir daí, a vida de Morvern se transforma, ela começa a viajar. A VIAGEM é o tema do filme, um romance de viagem que começa com a lição de que nenhuma obra vale uma vida.

É viver a obra, ou nada. Tenho dito.